sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

entrevista

paulo rehouve:
pós-ateu, será que disse bem?
manuelmelobento:
sempre tive dificuldade em acreditar em divindades. é facto que durante muito tempo, pela educação que recebi, dirigi o meu pensamento para esse altíssimo reconfortante. depois, uma pessoa cresce, reflecte e opta. cheguei à conclusão que ser ateu era fazer o jogo religioso ao contrário; era cair num discurso que se escondia em substituições. como seres programados não estamos capacitados para perceber o universo nem os contornos que envolvem seu começo se até isso se pode assim tratar. o que temos pela frente é a observação humana caracterizada pela aceitação do mito por um lado e pela  actividade humana do outro que dá pelo nome de ciência. portanto, estar  numa ou noutra  posição é muito cómodo. eu prefiro catalogar essa atitude para me conhecer melhor, isto é, ver de longe sem afectação.
pr:
complexo de superioridade?
mmb:
não me incomoda!
pr:
a filosofia ensinou-lhe alguma coisa estranha?
mmb:
algumas mensagens organizaram o meu pensamento. deram-me mais elasticidade para olhar o envolvente. conduziram o meu pensamento reflexivo até certo ponto. depois, libertei-me de alguma lógica perigosa que por ser armadilhosa não tem refutação aparente, isto se jogarmos pelas suas regras.
pr:
como se pode fugir à lógica "perigosa"?
mmb:
pela sensibilidade. já reparou, por exemplo,  como a racionalização de um ponto  intermédio num espaço  euclidiano entre dois pontos nunca se pode atingir, visto que para uma pessoa se deslocar do ponto a para o ponto b terá de passar por c que fica no meio. depois terá de passar pelo ponto que divide os dois e assim indefinidamente. este exemplo "corriqueiro" serve para apelar a uma solução sensível para um problema insolúvel do inteligível. isto é, se  lhe atirar uma pedra - estando eu no ponto a - na direcção da sua  cabeça que está no ponto b, não acha que pode ir parar ao hospital se eu lhe acertar?
pr:
o seu mundo é resolvido pela sensibilidade?
mmb:
deixo ao meu cérebro a resolução de tudo. desde os erros que a sensibilidade me fornece até à racionalidade impante de certezas.
pr:
quer dizer que o seu cérebro é tudo. o pior será se avariar.
mmb:
se  não tiver conserto que hei-de fazer? (risos )
pr:
o ensino actual merece algum comentário?
mmb:
está na mão de criminosos. isso levaria a uma longa conversa que não caberia nesta entrevista. porém, posso dizer que a educação é uma preparação que começa logo nos primeiros momentos do nascimento. uma criança mal tratada não estará , de futuro, apta a aprender nas melhores condições. assim como mal nutrida também. o período de aprendizagem com outros que não os pais deve começar a partir dos 3 anos. como se pode criar o conceito de cidadão se a maioria das crianças chega à escola depois de um longo calvário de rua e/ou sofrimento às mãos de amas que as maltratam muitas vezes por ignorância? estão marcadas e distinguem-se negativamente na prossecução da aprendizagem. a maioria dos professores preocupa-se muito pela classificação e selecção tendo em conta os conteúdos dos programas, esquecendo que a massa humana que têm entre mãos já se encontra muito limitada e imprópria para o consumo de algumas matérias.
pr:
há milhares de jovens diplomados, isso não significa sucesso?
mmb:
a maioria dos diplomados  formou-se por modas. valem o que valem mas num outro mundo. temos elites entre nós, sim, mas isso é apanágio da burguesia que prepara os filhos o melhor que pode. veja-se onde páram os cérebros que foram produzidos pelo nosso ensino superior? uma limitada fila está colocada pela "família" a que pertence nos lugares de estadão. quanto aos outros (fila quase infinita), bem, estão no desemprego ou têm de emigrar. mas, pergunto, que lugares ocuparão sociólogos, psicólogos, teólogos e outros que tais quando emigram?
pr:
a  política preencheu-o?
mmb:
nunca fui homem para me dedicar a uma actividade a cem por cento, excepção feita a partir da minha profissionalização como professor. a actuação política devia competir a todos sem excepção. só assim se evitaria que o estado fosse tomado e dominado por pessoas pouco dignas. as castas existem e é muito difícil governar contra elas sem o apoio político da população. a ignorância generalizada do povo impede que o estado funcione exclusivamente para o seu serviço.
pr:
o que pensa da europa dos 27?
mmb:
é uma cobra com muitos anéis  em agonia. prevejo a constituição de uma liga de futuros estados católicos  unidos do sul da europa e que integrarão portugal, espanha, itália, grécia e a frança que acaberá por fazer parte desta liga. a cultura latina tem tendência a aglutinar-se separadamente das outras. olhe-se o novo mundo e veja-se como ela se formata. isto para não se falar da clarividente cultura greco-latina mesmo à nossa porta.
pr:
que apreciação faz da política portuguesa chefiada pela coligação psd/cds?
mmb:
neste momento está claro o que pretende o governo chefiado por passos coelho. impôs ao povo o modelo de economia de mercado que gere a europa e a américa em troca do estado social com raízes socialistas que foi sufragado popularmente e que se encontra na nossa lei fundamental. nada teria a criticar não fora o facto de ter traído o eleitorado com promessas falsas e contrárias. se o povo tivesse escolhido este caminho, não falaria senão contra o povo. este foi enganado e continuará a sê-lo porque a nossa sociedade caiu numa armadilha e quanto mais se mexer mais presa ficará. neste momento não há volta a dar. as manifestações não surtiram o efeito desejado que era fazer com que o executivo recuasse até às tábuas. a manter-se o rumo desta política, os investidores  irão surgir em força pois os seus investimentos permitir-lhes-ão os lucros por que esperam. repare-se no descaramento de passos coelho quando anunciou a nova tabela indemnizatória para os despedimentos. os trabalhadores só terão direito a 12 dias por ano ao serem despedidos. disse ele que foi acordado. com quem? com os estrangeiros. e nós por cá? todos bem, graças a deus e a dom policarpo e a esperar que catalina  vá buscar ao saco das perversões alguns casos que ela  - coitadinha - desconhecia   e que servirão para entreter o pagode sequioso de sangue e circo.
pr:
acha que o partido socialista vai deixar que portugal tome este rumo?
mmb:
ora essa, foi o partido socialista quem deu início a esta viagem construindo a antecâmara para onde fomos empurrados. o partido socialista arrepiou caminho (1975) quando se apercebeu que o mundo socialista se desmorona com qualquer pé de vento se não tiver forças de repressão a actuar a seu favor. aliás, para sobreviver na cola dos dinheiros do estado, o ps terá de apoiar no terreno a política do psd, enquanto no palco de todas as vigarices acusa o governo de estar a trair o povo. é a prática e esta é a traição por valores de pouca vergonha.
pr:
será que o presidente não tem uma palavra a dizer?
mmb:
cavaco é  um presidente a termo certo (e ainda bem). hoje dirigiu mais a senhora dona maria uma mensagem de boas festas ao patético povo português. disse ele que neste tempo de sacrifício de todos. interrompo aqui para dizer que este senhor está a gozar pelo menos comigo. nem todos estão a fazer sacrifícios meu cara. só se ele acha que um tipo que ganha 12.000 euros mensais se sacrifica se passar a auferir 9.000. sacrifício é quando não houver pão para alimentar os filhos por se ter sido despedido. passar necessidades  - fome incluída - e ver no futuro uma desgraça, isso sim dá vontade de chorar. isso sim é que é sacrifício. deviam ser proibidas as mensagens de boas festas e de fim de ano. calem a boca!
pr:
já o chamaram de escritor e artista plástico. ainda se sente como tal?
mmb:
aprendi a escrever e a pintar na escola. agora se sou escritor ou pintor, isso é coisa que eu tenho de respoder a mim e não a outros. não lhes dou confiança para perceberem que a minha realização passa por ser liberta e não mercenária. ser-se livre paga-se um preço muito caro, mas sabe tão bem. é como desejar uma bela, intocável e impossível mulher e ela cair-nos nos braços enquanto (uma pessoa fica espantada e entesoada) - se despe na nossa cama. a gente a comê-la e o pagode cheio de inveja a dizer-nos que não temos beiços para ela.
pr:
hoje, não praguejou?
mmb:
porra, esqueci-me!

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