domingo, 21 de setembro de 2014

independência dos açores: sim ou não?

                                      


quando o império português implodiu encontrava-me a viver há muito em lisboa por opção e por paixão. tínhamos a noção do que era viver sob o medo de uma ditadura capadora de qualquer tipo de novidade intelectual que despertasse o homem agrilhoado que éramos. um estado policial fortemente blindado tomava conta da vida dos portugueses do nascer até à morte. o estado novo servia-se da religião oficial para conter qualquer tipo de anseio de grupos mais abertos à mudança. o estado deliberava e a igreja mentalizava. os políticos não falavam para o povo e se houve algum discurso de natureza mais dada a interpretação de ordem política foi para nos enfiar no buraco da guerra colonial com gritos de patriotismo. quem costumava falar político era a padralhada do púlpito. isto é, debitavam histórias de judeus no deserto nacionalizando-as e tornando-as tragáveis: respeito e deus feroz que não permitiam desvios. e esses desvios eram muito naturalmente o querer melhorar as condições de vida. portugal era uma capoeira onde meteram  porco macho em vez de galo. estou a referir-me ao campo das mentalidades. o português intelectual da altura era um imbecil do tamanho do ranho de mastim italiano só comparável aos intelectuais-mentores-de- hoje que enxameiam o arco da governação paridos pela junção da canção da gaivota com o cravo vermelho. claro que há exceções, que já morreram, claro. e os açores? pior um pouco. os açores eram na altura - década de setenta do século passado - uma comunidade a quem retiraram o direito de pensar. sob a tutela de fascistas arredondados nós estávamos feitos nuns mórmons sem direito a segunda mulher. meteram tanta caca na cabeça dos micaelenses (as outras ilhas que se pronunciem) que raramente se distinguia um catequista de um deles. tive a sorte de ter amigos rurais de mentalidade mas que tinham recebido de herança umas centenas de livros proibidos. como não liam, acabei eu por os ler. foi assim que abri a torre de controlo ao mundo interdito. eu era uma bestaça até ter começado entender que à minha volta as pessoas alimentavam-se de mentiras. a minha ilha era uma missa sempre em pé. os professores, os padres, os chefes de família, os polícias e seus comandos eram mais quadrados que a cabeça do senhor lara do testamento segundo jesus cristo. eram tudo erva daninha   que crescia em paralelo ao chão que dava três ou quatro culturas. quando trabalhado, claro. o que eu fui dizer ... certo dia quando questionei a divindade de um homem que se intitulava deus ou coisa parecida. foi o meu fim.  para acabar o ensino liceal só o consegui em lisboa. ninguém me conhecia, pudera! professoras que espumavam pela boca quando a questão lhes era colocada. algumas diziam: deus não se discute! nós éramos mais judeus que os próprios judeus e os seus livros sagrados eram o nosso guia. neles até havia receitas para petiscos pois deus era um connaisseur e tinha no moisés um interlocutor diário. a vida social estruturava-se em estratos sociais distintos. vigiados de cima para baixo. eh pá, convém dizer que nos parecíamos mais com uma jihad  pacífica. nada que se comparasse aos atos-de-fé levados a efeito pela inquisição. independência dos açores? calma! fica para amanhã!
mmb

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