Entrevista conduzida por Paulo Rehouve.
Varett é um nome atrás do qual se esconde uma personalidade difícil de descrever. O leitor procure caracterizá-lo através das respostas.
Paulo Rehouve - O senhor disse que não daria mais nenhuma entrevista, mas mal o convidei aceitou logo. Não acha que isso o desprestigia?
Varett - Eu sou como as putas. Além disso o meu preço está tabelado.
PR - Poderemos falar de tudo?
V - Claro. Não devo nada a ninguém.
PR - Comecemos pelas mulheres. Já alguma vez amou alguma mulher?
V - Nunca, mas sim partes dela.
PR - O que é o sexo para si tendo em conta a sua idade?
V - Está a preços proibitivos.
PR - O que aprecia mais na mulher?
V - O corpo dela na cama.
PR - O que lhe parece que é o amor?
V - Um pântano que seca quando há muito calor.
PR - Mantém relações sexuais regulares?
V - Nisso sou muito irregular. Se tenho dinheiro a mais vou procurar o que é bom no mercado. Gostava de ser amigo do senhor Berlusconi. Esse sim, dá bom uso ao dinheiro que tem, e é de longe muito melhor homem do que o criminoso do Bush.
PR - O senhor às vezes diz que não está livre de levar no cu. É homossexual?
V - Ninguém sabe o dia de amanhã é o que eu sempre digo. Nunca levei no cu. E experiências meio gay, tem para aí mais de sessenta anos. No entanto, devo dizer-lhe que há coisa de uns dez anos fui abordado por um ser muito bonito. Era um rapaz que parecia uma rapariga. Devia ter, talvez uns treze anos ou catorze. Era de noite, estava com os copos e estive quase a embarcar na folia. Descobri a tempo que era rapaz e não quis. Talvez tivesse experimentado. Bem, mas isso agora é crime. Porra, retiro o que pensei.
PR - Que acha do casamento entre pessoas do mesmo sexo?
V - O que elas quiserem.
PR - A família é para si a base da sociedade humana?
V - Se for como a Sagrada Famíla, digo que não. O pai não é pai mas padrasto. A mãe não faz sexo com ele e o filho - que enlouqueceu - tem um pai que o abandonou.
PR - Jesus enlouqueceu?
V - Deve ter apanhado muito sol na tola quando viajava a pé nas margens do rio Jordão. Tanto que foi assim que às tantas começou a dizer que era filho do criador e criador ao mesmo tempo. Quando o estudei mais a fundo tive pena dele. Mas ao mesmo tempo ele não era parvo, pois tinha sempre muitas mulheres com ele. Dizem que fodia com a Maria Madalena. Mas isso eu não sei, não estava lá.
PR - Que tal estamos de vícios?
V - Vão-me abandonando. Agora estou a habituar-me a morrer. É o meu último vício. E parece-me que não me vai abandonar.
PR - Tem trabalhado na sua arte?
V - Primeiro, não lhe chamo arte mas sim pincelismo. Há seis meses que não estrago tintas nem cartões. Estou nos finalmente. Do meu tempo estão poucos vivos. Morreram os bons e os filhos de puta. É o tal hábito de que lhe falei.
PR - Tem exposto?
V - Sim. Em tascas e tabacarias.
PR - Sabe-se que já se fizeram exposições com trabalhos seus em organismos oficiais.
V - Calma! Eu ofereço os meus rabiscos e os proprietários podem fazer deles o que quiserem. Vender, expor, dar, queimar, etc. Não tenho nada com isso. Porém, não deixo de estar agradecido pela consideração que têm pelo meu trabalho de mais de cinquenta anos. Mas mais do que isso não. Não quero misturas com quem oficialmente é considerado. Aliás, a única coisa que estava à espera era de que a ministra da Cultura criasse um local onde os marginais pudessem expor os seus trabalhos, mas sem estar a dever favores ao poder nem ser subserviente. A ministra Canavilhas é mais uma burguesa sem visão de história. Nenhum povo assumido apaga o que lhe parece ser uma nódoa do sistema. Para isso tivemos o salazarismo e a Primeira República. Era tudo tão bonito à vista aparente. Os fascistas juravam que Portugal era macho. A Igreja confirmava. O pior é que como está tudo no segredo dos deuses torna-se difícil fazer a verdadeira história. Por isso é que Hermano Saraiva está nas suas sete quintas quando fala da história de Portugal.
PR - O que tem a ministra Canavilhas com o caso?
V - Na véspera da visita dela ao museu de Arte Antiga coloquei por detrás de uma das minhas pinceladas que preguei nas paredes uma mensagem para lhe abrir os olhos sobre a posição da contra-cultura nacional. Ou ela não lê jornais pois esta acção reivindicativa saiu no jornal i - secção cultural, ou ela não recebeu a mensagem tendo os responsáveis por aquele elefante de bosta desviado a correspondência. Em última análise deve estar a cagar-se para certo tipo de arte que intervém contra o sistema. O que é crime intelectual. Havia uma carta dirigida à ministra. E como se sabe os bandidos tomaram conta da maioria das galerias e fazem gato sapato dos artistas que estão fora dos seus circuitos. Onde está o dinheiro para apoiar os artistas que não comem com os galeristas que estão feitos com alguns museus oficiais? Tudo isto é muito complicado. E para ajudar à festa a inveja acompanha toda aquela gentinha.
PR - Mas se você recebesse apoio oficial não estaria a fazer como os outros e a tornar-se igual a eles?
V - Porra, você não percebeu nada do que eu disse. Eu quero que o poder se foda. O que eu quero fazer ver é que deveria dar-se um maior apoio aos marginais. Um marginal não baixa as calças ao poder nem aos poderosos. Estes têm dever para com a sociedade em geral e não em particular. Ou você está como os outros que para limpar as cidades se deve matar todos os sem-abrigo que não querem ser encaixotados em quartos sociais?
PR - Podemos falar de política'
V - Não! Esta entrevista já tem merda que chegue.
PR - Vou fazer-lhe uma pergunta que já foi feita ao Luiz Pacheco. Que mensagem para a juventude?
V - Que venha para a rua em força e faça cair este regime de gordos e os expulse das estruturas do poder.
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