domingo, 5 de dezembro de 2010

SÁ CARNEIRO, O MITO E O SEXO




A ideia que tenho de Sá Carneiro coloca-o no palco do aloucado. Sabe-se que pelo menos, retrocedendo até ao avô, a família fazia cinco refeições diárias e com criadagem à volta dos meninos. Que - os famliares - habitavam em solares imponentes, onde a capela para as rezas se colava para os ofícios religiosos, tipo fidalgos como os da "Casa Mourisca". Sá Carneiro fora criado com personalidade cristã. Era o que estava a dar na altura. Rico, feiote e baixo, mas com força interior que impedia medi-lo no que apresentava, isto é, irradiava dele pessoa bem comida, bem bebida, bom porte, magnetismo, capacidade de se movimentar em qualquer espaço sem ser por ele contaminado, etc. Nascido dentro da teia cristã que tudo dominava, esteve até ao 25 de Abril de 1974 fechado sobre o pensamento e as tolices do Estado Novo que tudo capava à sua volta. Ele era pertença da Igreja. A Igreja fez-lhe a cabeça. Casado e com filhos juntava-se ao grupo de casais por ela orientados, ao gosto de uma burguesia que impedida de praticar política ponha-se a estudar os ditos de Cristo adaptados pelos europeus. Diga-se que melhor do que a ideologia cristã nada havia que contribuisse para a realização pessoal tendo em conta o outro como serviço público. Se não estou em erro, Sá Carneiro só tinha relações sexuais com o fim de procriar. Como comandava a Santa Madre Igreja no seu saber libidinoso, coadjuvado pela prática dos democratas-cristãos chefiados pelo semibeato Adelino Amaro da Costa e pelo austero Diogo Freitas do Amaral. Sá Carneiro era um marcelista, nada mais. Porém, dentro do marcelismo havia lugar para algumas bocas, sempre dentro do protocolo cristão. A diferença entre salazarismo e marcelismo era de que aquele cheirava a mofo e a rato morto com veneno camarário. Ao passo que o marcelismo tinha por lema teórico uma pequena abertura, do tipo buraco da agulha. Sá Carneiro investiu por ele e pediu o repatriamento do bispo do Porto que tinha escrito uma carta pornográfica (1) ao então chefe de governo e foi por este mandado embora do país. Marcelo acedeu, o que lhe deu força moral (cristã , claro). Mais tarde, quando Sá Carneiro entra para a Assembleia Nacional, algo o impele para dar mais um jeito à República autocrática em que nos transfomámos. Não foi bem aceite e "despediu-se". A ele e a outros que alinhavam por uma pequena abertura foi-lhes atribuído o apelido de "Ala Liberal". Podia ser pior, mas foi o que se pôde arranjar. Veio o "25 de Abril" e zás trás. Portugal em vez de tombar, deu um salto mortal. A vontade de destruir era tanta que os novos políticos só pensavam na política de terra queimada. A verdade seja dita, meia dúzia de dias depois do descalabro abrilista, Sá Carneiro juntamente com outras personagens arejadas do marcelismo criaram um partido anti-marxista. Sá Carneiro deu a cara e o peito numa altura perigosíssima para quem não fosse comunista ou socialista-marxista. Parecia um galo da Madeira entre uma cambada de guedelhudos ditos de esquerda e de extrema exquerda prontos a matar. Sim, a matar. Tiro o chapéu a Sá Carneiro, pois sei por que passou, uma vez que vivia na altura em Lisboa e sabia o que era aquela merda, com perdão da palavra. Sá Carneiro, em Lisboa, dá-se com Natália Correia. Pronto, foi o fim da sua virgindade. Natália era uma figura que só se encontra nos sótãos ou em "cabarets". Nos sótãos, nos livros proibidos e poeirentos. Uma mulher de garra, que falava de sexo como quem espreme uma laranja. E fá-lo entoando uma liturgia orgíaca na sua Taberna. Aliás, Natália para além de debochada era uma poetisa de muita audiência dita intelectual que a endeusava pelo despondunor e estouvamento de linguagem. Num período de revolução, Natália, a poeta indigitada como amoral pelo Estado Novo, estava como peixe no seu aquário. Com tal convivência, Sá Carneiro apercebeu-se de que tinha vivido até ali como um asno perfeito. Aquela "esquerda" era gira e o passado rigoroso de missas e encontros religiosos já era. Homem novo e com tesão, uma vez enredado pela poetisa e alcoviteira Natália, caíu que nem um tordo. A Natália vai juntar uma loura boazona, nórdica, educada, culta, charmosa ao ex-rogai por nós pecadores, e pumba. Sá Carneiro ficou vidrado, até parecia que vivia a tripar com charro marroquino. Casado com uma senhora do Porto, feiota mas de boas famílias, o nosso social-democrata não resistiu. Ameigou-se com a bela loura. Entrou em paranoia: confundiu São Bento com um lupanar. Aliás, aquilo foi e é mais ou menos uma casa de passe. Foi lá que Salazar deu umas quecas a uma francesa, também ela loura e não burra. Nada de anormal, portanto. Sá Carneiro para além de fazer amor com a nórdica quis imitar Dom Pedro, que fez da amante rainha (depois de morta, dizem). Meus senhores, comigo é assim, sem a minha amásia não vou para parte nenhuma. Perceberam? Querem? Queremos sim, ó grande líder. Depois desta resposta a loura ficou meio oficializada. Ah, grande Sá Carneiro, que puseste todos os noveis donos da nação a chuparem a presença da nórdica em comemorações e actos oficiais. O pior não era a presença dela, o pior era de que ela era bonita e dava colorido a tudo que a rodeava, bem ao contrário das "esposas" estilo mulher do Américo que a invejavam. Não resisto a contar um pequeno episódio que me fez gostar de Sá Carneiro. Convidado para uma recepção em Londres, onde pontificava Isabel II, respondeu do seguinte modo ao convite oficial que impedia que a loura o acompanhasse: cancelo a visita. Boa, a Isabel II de Inglaterra e de outras terras ocupadas à força, numa rota de colisão que a todos toca, tem mais amantes e escândalos na sua corte (filhos, noras e netas) que qualquer reino africano. A querer fazer-se melhor que o nosso príncipe do Norte, olha para ela! Bem, Sá Carneiro está outra vez nos noticiários. Que utilidade? Penso que ele aparece lá de vez em quando porque os social-democratas estão desunidos. É cada um puxar para o seu lado. Convém que o mito que a maioria já esqueceu sirva ao menos aos pretendentes à liderança que se contenham ou vão para a rua. Para a rua onde Francisco Sá carneiro dispensou a mediocridade.

mmb

(1) - Porque atentava contra a pureza do Estado Novo.

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