terça-feira, 29 de maio de 2018

AH, que prazer de morrer: abre as pernas querida Eutanásia

Estou perto dos oitenta anos. Segundo o cardápio das funerárias eu estarei à vez. E não é que um dia destes recebo um telefonema  esquisito de um agente daquelas empresas a perguntar se eu não queria fidelizar-me num sistema de pague agora aos bochechos e morra depois sem estar a chatear a família depois. Não obrigado! Só que depois pus-me a pensar, e por que não? Passar-lhes dinheiro para as mãos? Não vou nessa porque se a funerária falisse lá ficava eu de rabo ao léu numa praia qualquer. Ainda se fosse a Praia dos Cães (isto é para dar um certo cunho de cultura...) Bem, então comecei a separar uns trocos para poder custear o meu próprio enterramento. Eu sei que como fui funcionário público terei direito a um subsídio de funeral. Com estes empresários que nos governam, foda-se! Sei lá se quando me faltar o ar não tenham arranjado mais uma lei para me comerem aquilo que resta de um direito que tinha adquirido e que era o de morrer bem, pois "levava" comigo seis vezes o valor da reforma. Belos tempos de morrer que já não voltam mais.  Bem, vamos mas é a coisas práticas antes que morra de uma apoplexia como qualquer cónego cosido e cozido pelo nosso querido e superior Eça. Ora deixa cá ver. Vou começar por transcrever um pequeno trecho de "O Crime do Padre Amaro". Meu intróito: o sacana do pároco Amaro Vieira estava já muito guloso em relação à Amelinha, moça bonitota e apetecível como qualquer rapariga do Cancioneiro Açoriano: 

Toda a moça que é bonita
que ela chora que ela grita
nunca houvera de nascer.
É como a maçã madura
da quinta do padre cura
todos a querem comer.

Nesta história é o pároco que a come ou é comido e depois lá mais para diante acaba ela por morrer mas não por causa da Eutanásia. Tratou-se de um aborto, penso eu que ainda não (re)cheguei ao fim e a memória já está seca como a areia dos desertos. 
Vamos então ao Eça (Ed. Porto Editora - ISBN 978-972-0-04963-6):

"... Recordou o seu pé, o bocadinho da meia que vira quando ela saltava as lamas na quinta, e essa curiosidade inflamada subia pela curva da perna até ao seio, percorrendo belezas que suspirava..." 

Ah, desgraçado! Mas que diabo tem a ver esta história mal contada com a morte assistida? Calma, não sejam estúpidos! Viver é uma coisa que sabemos bem o que é desde que nos entre o ar pelas goelas e pudermos pôr o nosso cérebro a raciocinar. Voltemos ao pé da Amélia. O padre Amaro era um perfeito asno! Coitado. Vai do pé ao seio sem parar na exploração congeminada da cloaca da sua desejada que ficava a meio caminho. Para ele ainda era coisa sagrada ou então nunca vista. Se, nos dias de hoje, Amaro fosse a uma praia das nossas havia de ver os rabos das queridas tapados com um fio elétrico, o que permite deduzir ranhuras ou coisas parecidas. Ora, coisas da vida até podemos inventar porque está ao nosso alcance pensá-las. Na vida temos de tudo. Sobretudo desejos. E quando os alcançamos, ui que coisa boa. Esta cena do padre Amaro, o desnudamento das moças pelo verão, os banquetes congestionáveis, as bebedeiras, as saborosas  relações sexuais fora dos Mandamentos da Lei do senhor Moisés, todas estes classificados são coisas a que nos podemos agarrar pois são coisas da vida. E onde entra aqui a questão da Eutanásia? Primeiro, de que se trata? Mandar um gajo para o Outro Mundo - assistido - sem que ele perca a dignidade? Sem que ele sofra dores atrozes? Sem que ele se borre todo em merda para que  terceiros lhe limpem o buraco expedidor? Um desgraçado que nem possa meter à boca o conduto que lhe permita continuar vivo? Um pobretanas que se esquecera da utilidade de um pénis e que de um momento para o outro começa a ficar admirado por ele projetar, melhor pingar um líquido amarelo a que as avós chamam de chichi quando os netos o despejam  nos seus colos? E quanto às mulheres? Como não tenho clitóris, deixo isso para discurso feminino. Mas continuando: sentado numa cadeira para toda a vida ou sujeito a intubação  numa cama de uma instituição hospitalar ou num lar de  amontoados sem se poder mover? Andar um velho como eu ou um dependente com fraldas todas cagadas à espera que alguém o venha limpar e a sofrer comichão interminável? Estar em casa deitado e só   sem se poder mexer enquanto a família vai trabalhar para trazer o pãozinho para o bucho? Não ter ninguém que o acompanhe no silêncio interrompido pela dor dos gemidos? São tantas as desgraças que um pobre Diabo ou pobre de Cristo está sujeito no fim da vida ou no Inferno das dores que eu digo: matem-me! Matem-me pela alminha dos seus! Espera, espera! Não se arranja por aí uma droga para que antes de partir me possa fazer  confundir a morte com uma boa foda (não tenho outra palavra de momento, pois estou a ver  a morte pela minha frente, não como o pateta do Amaro olhando a perna composta de Amélia, mas como a entrada nos meus lençóis daquele borracho sueco que vi na praia da Manta Rota e que nunca mais saiu da cuca). Estou num hotel a tentar dormir e eis que de repente, ela toda despida de roupa e de preconceitos se deita em V e diz-me despacha-te que há mais gente para morrer. Não gosto de pressas, mas lá vai disto. Matem-me, grito eu com todas as minhas intenções. A todos aqueles que julgam que não se deve contrariar os desígnios de Deus e que se deve chupar o tutano da vida  até à toca; a todos os que preferem viver como um vegetal mal cheiroso; a todos aqueles que optem por viver num Inferno de dores e desconforto; a todos aqueles que sonham de olhos fechados, pois que lhes seja dado o direito de "viver".  Cá por mim, que venha a dona Eutanásia e se possível que ela seja loira, mulata, negra, porém novas e que estejam todas depiladas e despidas, como manda a moda de agora. Passem-me já a pomada (*) e adeus sem pensar  no meu regresso. Aliás, não desejo regressar. Só se fosse para leão no Serengueti. Vá lá...

(*) - Droga que faz confundir a morte com um ato sexual de relevo.

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